Via no interior do povoado.
Aspecto de uma das zonas habitacionais.
Pormenor de uma cabana reconstruída.
Domínio visual sobre a paisagem.
Pedra Formosa.
Recentemente, realizei uma visita a alguns elementos patrimoniais do Distrito de Braga, entre eles estava a Citânia de Briteiros cuja grandiosidade a torna merecedora deste post.
Conhecida desde o séc. XVI, sendo citada em textos de antiquários da época, a Citânia de Briteiros é um conjunto impressionante. Implanta-se num maciço montanhoso (rondando os 300 metros), no qual se destaca o Monte de São Romão, na margem direita do Rio Ave, para o qual, de resto, tem um largo domínio visual.
Localizado no Concelho de Guimarães, o relevo estende-se entre as freguesias de São Salvador de Briteiros e de Donim.
Os vestígios arqueológicos mais evidentes, e que se revestem de maior monumentalidade, correspondem à ocupação proto-histórica do monte, durante a II Idade do Ferro, em particular nos dois últimos séculos antes de Cristo. Desta circunstância decorre a designação do sítio como “Citânia” palavra aplicada aos grandes castros do período pré-romano.
Um aspecto importante do relevo em que se ergue o povoado é a abundância de granitos que facultaram a matéria-prima com que foram construídas as muralhas e as habitações do castro, ou os elementos de uso comum como mós e pias.
Como forma de subsistência, os habitantes cultivavam cereais, como o milho e o trigo, leguminosas, como a fava e a ervilha, e pastoreavam gado ovino, caprino e bovino. A caça e a pesca desempenhavam também um papel importante no modo de sustento destas gentes. A economia do povoado passaria igualmente pela produção artesanal, constituindo a olaria, a metalurgia e a ourivesaria alguns vectores importantes.
Como apontam os arqueólogos, a Citânia estava situada num ponto estratégico, onde a navegação do Ave, para mercadorias, terminava, e terá sido um mercado obrigatório de troca de bens. Aliás, observando um mapa do Entre Douro e Minho, é interessante constatar que Briteiros fica num ponto central, entre os dois rios (Douro e Minho) e entre o litoral e as montanhas interiores.
Pouco se sabe sobre as fases iniciais do povoado, embora tenham sido encontrados materiais cerâmicos da I Idade do Ferro, momento em que o povoado já seria defendido por uma muralha.
Alcançando 24 hectares de extensão máxima intra-muros, Briteiros conserva um sistema defensivo de três ordens de muralha, complementado com uma quarta linha a Nordeste e dois fossos escavados na rocha, no istmo de acesso ao esporão, o ponto mais vulnerável. A área urbana da Citânia, já conhecida, corresponde à acrópole, delimitada pela primeira muralha que circunda a plataforma cimeira da elevação, e à encosta nascente, na qual as estruturas se prolongam para além da Estrada Nacional 309, construída nos anos 30 do séc. XX e que penetrou no interior do povoado. Ocupa uma área aproximada de 7 hectares, equivalendo à zona escavada por Francisco Martins Sarmento e por Mário Cardozo. Dentro desta área foram identificadas 104 unidades domésticas.
Uma das particularidades da Citânia de Briteiros reside numa estrutura, habitualmente designada como “Casa do Conselho”. Neste edifício circular, com cerca de 11 metros de diâmetro e um banco corrido ao longo da parede interior, teria funcionado um órgão colegial de decisão onde se resolveriam os assuntos mais prementes do povoado.
Outra das edificações, considerada como de carácter público, é os edifícios de banhos. Em Briteiros existiram pelo menos dois: o que se conserva no sopé da encosta, a Sudoeste, e outro, mais arruinado, situado a Nordeste. Obedecendo a uma morfologia tripartida, a estrutura do balneário que se observa a Sudoeste, e que, segundo os estudiosos, corresponde a um padrão generalizado nestes edifícios, é constituída por uma fornalha, onde se aqueciam blocos de quartzito e granito, uma câmara de sauna, onde se acumulava o vapor espalhando água sobre as pedras incandescentes, e um compartimento de entrada, eventualmente com funções de vestiário. Este compartimento e a câmara de sauna eram separados pela “Pedra Formosa”. Único acesso entre os dois espaços, o orifício inferior da estela, embora permitindo a passagem de uma pessoa, era tão pequeno quanto possível, para evitar a fuga de calor. Além disto, o balneário apresenta também um pátio exterior lajeado, onde se dispunha um tanque de água fria, para o qual descarregava uma canalização.
Com a romanização do território, a Citânia vai perdendo influência e a sua implantação, com fortes características defensivas, deixa de ter razão de ser. As evidências arqueológicas sugerem que a partir da segunda metade do século I d. C. a ocupação da Citânia de Briteiros poderá ter sido residual. Ao longo do séc. I d. C. a população foi atraída para os novos aglomerados em plena expansão, novas civitates, como Bracara Augusta, ou vici, como Caldas de Vizela, ganham relevo em detrimento dos assentamentos de altitude.
Não poderia concluir este texto sem deixar expressa a justa homenagem a Francisco Martins Sarmento pelo importante papel que desempenhou na investigação arqueológica nacional. Nascido em Guimarães em Março de 1833, foi também nesta cidade que exalou o último suspiro em Agosto de 1899. Foi um admirável arqueólogo e escritor. A ele se deve a notoriedade que a Citânia de Briteiros adquiriu na Arqueologia. O projecto que idealizou, de investigação e conservação, e passou à prática a partir de 1874, que compreendeu campanhas anuais de escavação, é notável. A vontade de preservar conduziu à aquisição de grande parte da área onde se insere o povoado, executada a título pessoal. Este elemento demonstra que estamos perante um homem de verdadeira paixão. Mas Francisco Martins Sarmento era muito mais do que um homem apaixonado, era também um investigador extremamente dedicado e conceituado, colaborante em revistas e jornais científicos, com múltiplos contactos internacionais e permanentemente a par do que de mais avançado se fazia na Europa. A biblioteca que nos legou é indicadora disso mesmo pela quantidade e qualidade dos livros de que é composta.
Acrescentamos ainda que o sítio foi classificado como Monumento Nacional em 1910, ano em que foram muitos os elementos patrimoniais de âmbito arqueológico a receber a distinção.
Muito estará ainda por dizer, mas temos como satisfeito o nosso objectivo de divulgar e informar o caro leitor. A partir deste momento a pena muda de mãos…
Para os que se interessem pela cultura castreja, e especificamente pela Citânia de Briteiros, deixo o endereço virtual:
http://citania.csarmento.uminho.pt
Conhecida desde o séc. XVI, sendo citada em textos de antiquários da época, a Citânia de Briteiros é um conjunto impressionante. Implanta-se num maciço montanhoso (rondando os 300 metros), no qual se destaca o Monte de São Romão, na margem direita do Rio Ave, para o qual, de resto, tem um largo domínio visual.
Localizado no Concelho de Guimarães, o relevo estende-se entre as freguesias de São Salvador de Briteiros e de Donim.
Os vestígios arqueológicos mais evidentes, e que se revestem de maior monumentalidade, correspondem à ocupação proto-histórica do monte, durante a II Idade do Ferro, em particular nos dois últimos séculos antes de Cristo. Desta circunstância decorre a designação do sítio como “Citânia” palavra aplicada aos grandes castros do período pré-romano.
Um aspecto importante do relevo em que se ergue o povoado é a abundância de granitos que facultaram a matéria-prima com que foram construídas as muralhas e as habitações do castro, ou os elementos de uso comum como mós e pias.
Como forma de subsistência, os habitantes cultivavam cereais, como o milho e o trigo, leguminosas, como a fava e a ervilha, e pastoreavam gado ovino, caprino e bovino. A caça e a pesca desempenhavam também um papel importante no modo de sustento destas gentes. A economia do povoado passaria igualmente pela produção artesanal, constituindo a olaria, a metalurgia e a ourivesaria alguns vectores importantes.
Como apontam os arqueólogos, a Citânia estava situada num ponto estratégico, onde a navegação do Ave, para mercadorias, terminava, e terá sido um mercado obrigatório de troca de bens. Aliás, observando um mapa do Entre Douro e Minho, é interessante constatar que Briteiros fica num ponto central, entre os dois rios (Douro e Minho) e entre o litoral e as montanhas interiores.
Pouco se sabe sobre as fases iniciais do povoado, embora tenham sido encontrados materiais cerâmicos da I Idade do Ferro, momento em que o povoado já seria defendido por uma muralha.
Alcançando 24 hectares de extensão máxima intra-muros, Briteiros conserva um sistema defensivo de três ordens de muralha, complementado com uma quarta linha a Nordeste e dois fossos escavados na rocha, no istmo de acesso ao esporão, o ponto mais vulnerável. A área urbana da Citânia, já conhecida, corresponde à acrópole, delimitada pela primeira muralha que circunda a plataforma cimeira da elevação, e à encosta nascente, na qual as estruturas se prolongam para além da Estrada Nacional 309, construída nos anos 30 do séc. XX e que penetrou no interior do povoado. Ocupa uma área aproximada de 7 hectares, equivalendo à zona escavada por Francisco Martins Sarmento e por Mário Cardozo. Dentro desta área foram identificadas 104 unidades domésticas.
Uma das particularidades da Citânia de Briteiros reside numa estrutura, habitualmente designada como “Casa do Conselho”. Neste edifício circular, com cerca de 11 metros de diâmetro e um banco corrido ao longo da parede interior, teria funcionado um órgão colegial de decisão onde se resolveriam os assuntos mais prementes do povoado.
Outra das edificações, considerada como de carácter público, é os edifícios de banhos. Em Briteiros existiram pelo menos dois: o que se conserva no sopé da encosta, a Sudoeste, e outro, mais arruinado, situado a Nordeste. Obedecendo a uma morfologia tripartida, a estrutura do balneário que se observa a Sudoeste, e que, segundo os estudiosos, corresponde a um padrão generalizado nestes edifícios, é constituída por uma fornalha, onde se aqueciam blocos de quartzito e granito, uma câmara de sauna, onde se acumulava o vapor espalhando água sobre as pedras incandescentes, e um compartimento de entrada, eventualmente com funções de vestiário. Este compartimento e a câmara de sauna eram separados pela “Pedra Formosa”. Único acesso entre os dois espaços, o orifício inferior da estela, embora permitindo a passagem de uma pessoa, era tão pequeno quanto possível, para evitar a fuga de calor. Além disto, o balneário apresenta também um pátio exterior lajeado, onde se dispunha um tanque de água fria, para o qual descarregava uma canalização.
Com a romanização do território, a Citânia vai perdendo influência e a sua implantação, com fortes características defensivas, deixa de ter razão de ser. As evidências arqueológicas sugerem que a partir da segunda metade do século I d. C. a ocupação da Citânia de Briteiros poderá ter sido residual. Ao longo do séc. I d. C. a população foi atraída para os novos aglomerados em plena expansão, novas civitates, como Bracara Augusta, ou vici, como Caldas de Vizela, ganham relevo em detrimento dos assentamentos de altitude.
Não poderia concluir este texto sem deixar expressa a justa homenagem a Francisco Martins Sarmento pelo importante papel que desempenhou na investigação arqueológica nacional. Nascido em Guimarães em Março de 1833, foi também nesta cidade que exalou o último suspiro em Agosto de 1899. Foi um admirável arqueólogo e escritor. A ele se deve a notoriedade que a Citânia de Briteiros adquiriu na Arqueologia. O projecto que idealizou, de investigação e conservação, e passou à prática a partir de 1874, que compreendeu campanhas anuais de escavação, é notável. A vontade de preservar conduziu à aquisição de grande parte da área onde se insere o povoado, executada a título pessoal. Este elemento demonstra que estamos perante um homem de verdadeira paixão. Mas Francisco Martins Sarmento era muito mais do que um homem apaixonado, era também um investigador extremamente dedicado e conceituado, colaborante em revistas e jornais científicos, com múltiplos contactos internacionais e permanentemente a par do que de mais avançado se fazia na Europa. A biblioteca que nos legou é indicadora disso mesmo pela quantidade e qualidade dos livros de que é composta.
Acrescentamos ainda que o sítio foi classificado como Monumento Nacional em 1910, ano em que foram muitos os elementos patrimoniais de âmbito arqueológico a receber a distinção.
Muito estará ainda por dizer, mas temos como satisfeito o nosso objectivo de divulgar e informar o caro leitor. A partir deste momento a pena muda de mãos…
Para os que se interessem pela cultura castreja, e especificamente pela Citânia de Briteiros, deixo o endereço virtual:
http://citania.csarmento.uminho.pt